‘Nunca tive tanta vergonha do meu país’, diz representante da Rússia que renunciou ao cargo na ONU

23 de maio de 2022

O conselheiro da Rússia nas Nações Unidas em Genebra, Boris Bondarev, renunciou ao cargo nesta segunda-feira (23). Em sua carta de despedida, Bondarev disse que nunca se sentiu tão envergonhado com o próprio país.

“Durante vinte anos de minha carreira diplomática vi diferentes reviravoltas em nossa política externa, mas nunca senti tanta vergonha de meu país como em 24 de fevereiro deste ano”, afirmou o representante na sua carta.

 

Boris Bondarev ainda criticou o início da guerra e a forma como ela está sendo conduzida desde então.

“Aqueles que conceberam esta guerra querem apenas uma coisa – permanecer no poder para sempre, viver em palácios pomposos de mau gosto, navegar em iates e desfrutar de poder ilimitado e total impunidade”, criticou.

“Exemplo a ser seguido”

 

“Boris Bondarev é um herói”, disse o diretor-executivo da UN Watch, Hillel Neuer. O órgão é um observatório para as Nações Unidas.

“Agora estamos pedindo a todos os outros diplomatas russos nas Nações Unidas – e em todo o mundo – que sigam seu exemplo moral e renuncie”, diz a nota da ONG.

Segundo Neuer, Bondarev deve ser convidado para falar em Davos nesta semana.

Veja a carta completa abaixo:

 

“Meu nome é Boris Bondarev, no Ministério das Relações Exteriores da Rússia desde 2002 até agora — Conselheiro da Missão Russa no Escritório da ONU em Genebra.

Durante vinte anos de minha carreira diplomática vi diferentes reviravoltas em nossa política externa, mas nunca senti tanta vergonha de meu país como em 24 de fevereiro deste ano.

A guerra agressiva desencadeada por Putin contra a Ucrânia, e de fato contra todo o mundo ocidental, não é apenas um crime contra o povo ucraniano, mas também, talvez, o crime mais grave contra o povo da Rússia, com uma letra Z em negrito riscada todas as esperanças e perspectivas de uma sociedade próspera e livre em nosso país.

Aqueles que conceberam esta guerra querem apenas uma coisa: permanecer no poder para sempre, viver em palácios pomposos e de mau gosto, navegar em iates comparáveis ​​em tonelagem e custo a toda a Marinha russa, desfrutando de poder ilimitado e total impunidade. Para conseguir isso, eles estão dispostos a sacrificar quantas vidas forem necessárias. Milhares de russos e ucranianos já morreram só por isso.

Lamento admitir que ao longo de todos esses vinte anos o nível de mentiras e falta de profissionalismo no trabalho do Ministério das Relações Exteriores têm aumentado cada vez mais.

No entanto, nos últimos anos, isso se tornou simplesmente catastrófico. Em vez de informações imparciais, análises imparciais e previsões sóbrias, há clichês de propaganda no espírito dos jornais soviéticos da década de 1930. Foi construído um sistema que engana a si mesmo.

O ministro Lavrov é um bom exemplo da degradação desse sistema. Em 18 anos, ele passou de um intelectual profissional e educado, que muitos dos meus colegas tinham em tão alta estima, para uma pessoa que constantemente transmite declarações conflitantes e ameaça o mundo (ou seja, a Rússia também) com armas nucleares!

Hoje, o Ministério das Relações Exteriores não tem nada a ver com diplomacia. É tudo sobre belicismo, mentiras e ódio. Serve aos interesses de poucos, muito poucos, contribuindo assim para um maior isolamento e degradação do meu país.

Rússia não tem mais aliados, e não há ninguém para culpar, a não ser sua política imprudente e mal concebida.

Estudei para ser diplomata e sou diplomata há vinte anos. O Ministério se tornou minha casa e minha família. Mas eu simplesmente não posso mais compartilhar essa ignomínia sangrenta, tola e absolutamente desnecessária.”

Por g1

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